quinta-feira, 6 de abril de 2023

A Luz na Sala

Naquele canto, a luz se esconde dos olhares — Por ser uma luz fraca, decide abandonar todos os objetos que precisam de sua luminosidade. 

 Tanta luminescência para quê? Tudo o que ela tem feito durante esse grandioso espaço de tempo é clarão. 

 Esse que invade os cantos parados da casa é o mesmo que ilumina a vida inerte dessa imensidão vazia. O frio que cobre o pequeno foco é o elo entre o concreto frio e a corrente de ar corpulenta que domina o seu poder. 

Ficará ela ali, parada, quieta, até que perca a sua força e volte ao ponto zero. Seu domínio sobre sua consciência comedida, perder-se-á no chão do cômodo escuro. 

Ela, por sua vez, estará se apagando, diminuindo, enfraquecendo, até que suma dali. Restando somente um ponto na escuridão e a vaga lembrança de que ali jazia uma luz.

 Màuri Zeurgo


terça-feira, 4 de abril de 2023

Fuga das Memórias

Fogem as minhas memórias do outono frio e com perfume seco. Como sol de inverno em céu nublado, elas se desfiguram por entre as nuvens, descansando em toda a sua plenitude — descansam elas, nas lembranças. Dentre mares e oceanos, vi muitos amores perdidos, atravessando rios e terras, em busca de acalento, acariciando a doce solidão e escapando aos meus olhos nos confins da última parada chamada dor. Tudo foram sonhos, que alcançaram do topo das montanhas ao ventre dos rios. Percorreram assim, caminhos infindáveis na profundidade da imaginação absurda do homem. Restam agora os grandes moinhos de pensamento e lástima a girarem, espalhando os últimos suspiros nessa incrível aventura do amor. Ele, que de tanto almejar, supriu-se de estrelas e planetas numa simples canção de ninar, como numa respiração boca-a-boca entre o corpo e a alma. Aos amores eternos e também ocultos que vivi, guardados estão na minha memória — em especial um — aquele que me trouxe todo o sabor do passado, o segredo do universo e a velha alma do poeta com apenas um beijo. Selando assim, as verdades jamais faladas e que foram cumpridas ao longo dos tempos. A solidão não é o acúmulo de crenças e interesses, mas sim, o fato de se sentir emanado de um vazio, que o impede de se auto preencher com as coisas do mundo, mesmo à (dois). Isso transforma as nossas ilusões viáveis até o ponto de dizer-te amo. Essa sensação engana e nos dá a própria cara à tapa, fazendo-nos escravos daquele ditado platônico, que acaba sempre num quarto, sala ou varanda vazia, na companhia de uma taça de vinho, refrescos, chocolate e muita imaginação. Voltam a dormir as minhas memórias de outono e que o acalento dessa noite aqueça as suas mais íntimas lembranças, afim de se conectar com o velho e com o novo, mas sempre na direção certa. "Màuri Zeurgo"

domingo, 2 de abril de 2023

Árido (02\04\2023)

É neste solo seco e rude que encontro o caminho de minhas emoções. As sensações mais intensas e rumorosas transbordam nesse oceano intrínseco e ressequido de dúvidas que não são minhas. Na inquietude humana e tão mental que assola meus pensamentos há muito deturpados, vive nos arredores como um vácuo cerebral, aquele que comanda, o mesmo que ordenha as ovelhas e também se propulsiona ao abismo.

Na queda de suas próprias escolhas, a encolha abissal vem sempre deteriorando os ossos restantes por toda a vala ensanguentada, essa enchente seca traz aos olhos um mundo em chamas que habita em cada canto esquecido do coração. Onde foi que ficaram os valores do ser humano e os bons modos dos nossos antepassados e a quietude saudade pelo medo de um olhar acima e a palma quente com ferro?

Eis me aqui novamente na amplitude e na exatidão desse ínterim vazio chamado tempo, para completar meu espaço que é tão meu e somente minha mente compreende, ou não. Como prova de meus pesares e indícios de meus caminhos, meus pés falam por si e sabem compreender na íntegra a dor e o amor de enxergar o quão tóxicas são aquelas pessoas que te usam, te sugam e te desmembram a qualquer movimento incrédulo a eles.

Viver a luxúria do material e esquecer-se do espiritual e dos laços que te formaram humano, te empurra na poça de lama que o engole e o transfere inquietante e infinitamente ao desconhecido — a morte. A morte da mente, a carne, o júbilo sacro chamado espírito e toda a missa conhecida como vida são nada mais, nada menos que a resposta preparada aos que vieram sem se programar e aos que não voltarão sem um preço a se pagar.

E é nessa reflexão exaustiva que me atento aos traidores e me afasto da vida, aguardando a melhoria provinda de meus próprios esforços. Mesmo que a fonte indefinida de tentativas seque, sabemos que nosso caminho e nossas dores são resultados da falta de algo que não cabe a nos, nem a toda sabedoria, não cabe nem mesmo ao próprio ser humano comum, mas sim aos devaneios desse coração seco e árido.

Por Màuri Zeurgo


Alcance

No abismo tumultuoso dos sentimentos, ele mergulha diariamente, seu coração se debate entre as ondas revoltas de uma paixão impossível. A me...